Entre os dias 7 e 15 de março, aconteceu em Austin, no Texas, a 39ª edição do South by Southwest (SXSW), um dos festivais mais relevantes do mundo quando o assunto é inovação.
O SXSW é conhecido por reunir uma multiplicidade de áreas – tecnologia, negócios, cultura, música, cinema, sustentabilidade e muito mais – em uma programação intensa que combina palestras, painéis, estreias de filmes, experiências interativas e premiações.
É um evento que antecipa movimentos e aponta as tendências que vão influenciar o comportamento das pessoas, os rumos do mercado e as transformações da sociedade nos próximos anos.
Vamos compartilhar alguns destaques do SXSW 2025, com um olhar atento ao que pode impactar o setor de tecnologia.
A era da inteligência viva
Uma das palestrantes mais aguardadas do SXSW todos os anos, especialmente pelo público brasileiro, é a futurista Amy Webb, fundadora do Future Today Strategy Group. Sua participação é marcada pela apresentação do Tech Trends Report, um relatório extenso que reúne mil páginas de tendências emergentes em tecnologia, negócios e sociedade. No palco do SXSW, Amy faz uma espécie de síntese visual e comentada dos temas mais urgentes e provocativos do relatório.
Em 2025, o foco foi a chegada daquilo que ela chama de “inteligência viva” — uma nova fase da inteligência artificial marcada pela integração entre tecnologia, biologia e o mundo físico.
Segundo Amy, estamos entrando em uma era em que a IA deixa de ser apenas uma ferramenta digital e passa a interagir diretamente com organismos vivos, objetos e ambientes. Sensores cada vez mais precisos e miniaturizados estão sendo incorporados ao nosso corpo, roupas e dispositivos do dia a dia, possibilitando que a tecnologia sinta, reaja e se adapte em tempo real.
Ela também destacou a fusão entre IA e biotecnologia, com avanços como a criação de materiais vivos, proteínas artificiais e organismos modificáveis, capazes de responder ao ambiente e até se regenerar.
Outro ponto importante foi a forma como as máquinas estão aprendendo a se comunicar sem a necessidade da linguagem humana. Por meio de códigos matemáticos, elas podem trocar informações de maneira mais eficiente e veloz — o que traz tanto oportunidades como desafios éticos e regulatórios.
Para o setor de telecomunicações e tecnologia, as provocações de Amy Webb sinalizam transformações profundas no modo como os dispositivos serão pensados no futuro, com impacto direto na forma como nos conectamos, coletamos dados e interagimos com o mundo ao nosso redor.
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10 tecnologias que vão revolucionar o mundo
Durante o SXSW 2025, a MIT Technology Review apresentou sua lista anual das dez tecnologias emergentes com potencial para transformar diversos setores nos próximos anos. A seleção abrange inovações que prometem impactar áreas como saúde, energia e comunicação.
1. Observatório Vera C. Rubin
Localizado no Chile, este observatório astronômico conta com um telescópio refletor equipado com a maior câmera digital já construída. Previsto para entrar em operação em 2025, o observatório permitirá estudos aprofundados sobre a matéria escura e a Via Láctea.
2. Pesquisa de IA generativa
A pesquisa generativa promete tornar a busca por informações mais simples e rápida. Ao digitar uma consulta, um modelo de IA resume dados de diversas fontes on-line para fornecer uma resposta única, sinalizando uma evolução nos mecanismos de busca tradicionais.
3. Robotáxis
Veículos autônomos projetados para operar como táxis sem motoristas humanos. Empresas como Waymo e Uber já oferecem viagens com carros autônomos em cidades como Austin e Atlanta, indicando uma transformação no setor de transporte urbano.
4. Suplementos para redução de metano em gado
Inovações na alimentação bovina, como suplementos que reduzem as emissões de metano dos arrotos das vacas, representam um avanço significativo na mitigação de gases de efeito estufa na pecuária.
5. Aço verde
Novas técnicas de produção de aço que reduzem significativamente as emissões de carbono, contribuindo para a sustentabilidade na indústria siderúrgica.
6. Modelos de linguagem menores e mais eficientes
Desenvolvimento de modelos de linguagem de inteligência artificial menores, que consomem menos recursos computacionais, tornando a IA mais acessível e sustentável.
7. Terapias genéticas de longa duração
Avanços em terapias genéticas que oferecem tratamentos mais duradouros para diversas doenças, melhorando a qualidade de vida dos pacientes.
8. Tecnologias de captura de carbono
Sistemas aprimorados para capturar e armazenar dióxido de carbono da atmosfera, auxiliando no combate às mudanças climáticas.
9. Computação quântica
Progressos na computação quântica que prometem resolver problemas complexos de forma mais eficiente do que os computadores tradicionais.
10. Vacinas de mRNA para outras doenças
Expansão do uso da tecnologia de vacinas de mRNA, inicialmente aplicada contra a COVID-19, para o tratamento de outras doenças infecciosas e condições médicas.
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Mitos sobre a IA para abandonar em 2025
Sandy Carter, CEO da Unstoppable Domains e referência global em inovação, trouxe uma das apresentações mais práticas e esclarecedoras sobre inteligência artificial (IA). Com uma abordagem direta, ela desmistificou 10 mitos populares que ainda dificultam o entendimento e a adoção da tecnologia no mundo dos negócios.
Segundo Carter, ainda existe muita confusão sobre o que a IA é – e o que ela não é. Para ela, superar esses equívocos é essencial para que empresas de todos os setores consigam usar a tecnologia de forma estratégica e responsável.
Entre os principais mitos que ela destacou:
- “IA é só uma tendência passageira.” Na verdade, ela já faz parte do nosso cotidiano, de recomendações de produtos a sistemas logísticos.
- “Vai tirar meu emprego.” Carter reforça que a IA não elimina, mas transforma funções, criando novas oportunidades de trabalho em conjunto com as pessoas.
- “Implementar IA é muito complexo.” Hoje existem ferramentas low-code e no-code que permitem que até quem não é técnico consiga aplicar soluções de IA.
- “Qualquer dado serve para IA.” O sucesso da IA depende da qualidade dos dados – dados ruins geram resultados imprecisos.
- “IA é impessoal.” Pelo contrário: quando bem implementada, pode criar experiências mais personalizadas e humanas.
Ela também apresentou exemplos práticos de aplicação da IA em áreas como marketing, atendimento ao cliente, logística e dispositivos físicos, como robôs e próteses inteligentes. Um dos momentos mais emocionantes da palestra foi a demonstração de um braço biônico com feedback tátil, apresentado por Dani Damasi, da startup Psyonic.
A mensagem final foi clara: a IA já é uma realidade nos negócios e pode ser uma grande aliada. Mas para isso, é preciso abandonar os mitos e adotar uma mentalidade de aprendizado constante, inovação e confiança.
A vez dos agentes de IA
Um dos temas mais discutidos no SXSW 2025 foi o avanço dos chamados agentes de inteligência artificial — sistemas capazes de agir de forma autônoma, tomar decisões, executar tarefas complexas e interagir com humanos e máquinas em diferentes contextos.
Diferentes palestrantes trouxeram suas visões sobre como esses agentes estão redesenhando o futuro do trabalho, da tecnologia e das relações humanas.
Cristiano Amon, CEO da Qualcomm e um dos principais palestrantes brasileiros no festival, destacou o papel dos agentes de IA na transformação dos dispositivos móveis. Segundo ele, estamos caminhando para uma era em que os celulares — e outros dispositivos conectados — deixarão de ser passivos e se tornarão parceiros ativos dos usuários, antecipando necessidades e agindo proativamente. Essa mudança exige chips mais potentes e inteligência embarcada nos aparelhos, algo que já está em desenvolvimento pelas principais fabricantes.
O designer e VP da Microsoft, John Maeda, abordou o tema com um olhar mais humano. Ele reforçou que os agentes de IA devem nos liberar das tarefas repetitivas, permitindo foco em decisões mais criativas e estratégicas. Mas alertou: é preciso cuidado para não delegar decisões demais às máquinas — sob o risco de cair no que chamou de “arrependimento humano”, quando percebemos tarde demais o impacto de abrir mão do controle.
A futurista Amy Webb, por sua vez, apontou que os agentes de IA estão evoluindo rapidamente em termos de autonomia e adaptabilidade. Eles já são capazes de se organizar entre si, formar redes, negociar prioridades e até desenvolver novos meios de comunicação. Para ela, esse movimento marca o início de uma nova era em que a IA deixa de ser apenas reativa e passa a atuar como parte ativa e viva do ecossistema tecnológico.
Já Meredith Whittaker, presidente do app Signal, trouxe uma visão mais crítica. Ela alertou para os riscos que agentes autônomos podem representar em termos de privacidade, já que para funcionarem bem, esses sistemas precisam acessar uma quantidade massiva de dados pessoais. O desafio, segundo ela, é pensar em um modelo de IA que seja funcional sem abrir mão da proteção dos usuários.
Essas diferentes perspectivas revelam o potencial transformador dos agentes de IA — mas também os cuidados éticos, técnicos e sociais que precisam acompanhar essa evolução. Para o setor de telecomunicações e varejo, o impacto será direto: desde dispositivos mais inteligentes até novas formas de interação com consumidores.
Assista à palestra de Cristiano Amon
Assista à palestra de John Maeda
Assista à palestra de Amy Webb
Assista à sessão de Meredith Whittaker
Previsões de mercado: riscos, apostas e oportunidades
Professor da NYU, autor best-seller e um dos analistas de mercado mais contundentes do momento, Scott Galloway trouxe ao SXSW 2025 uma leitura afiada sobre os rumos da economia, da tecnologia e do comportamento.
Em sua palestra, Galloway destacou que a IA é a tecnologia com maior potencial de impacto desde a internet — e quem não souber integrá-la aos seus processos corre o risco de ficar para trás. Mas a IA é só o começo.
Ele acredita que estamos entrando numa fase de descentralização geoeconômica, onde países fora do eixo tradicional (como EUA e Europa) devem atrair mais capital e relevância nos próximos anos. Ele prevê uma ascensão de mercados emergentes — incluindo América Latina e Ásia — que pode redesenhar as cadeias globais de valor.
No campo das mídias e da atenção, Galloway fez uma aposta ousada: os podcasts devem se consolidar como a mídia dominante nos próximos anos. Isso porque oferecem intimidade, conveniência e um formato de baixo custo de produção com alto poder de engajamento — algo especialmente estratégico para marcas que buscam construir relacionamento com seu público.
Ele também comentou que o uso de celulares, especialmente entre adolescentes, tem sido um ponto de atenção em diversas partes do mundo. O banimento dos smartphones em ambientes escolares, segundo ele, deve ganhar força como uma medida para melhorar o foco e o desempenho dos alunos — um movimento já observado em lugares como o estado de São Paulo.
Galloway ainda apontou que empresas como a Intel podem se tornar alvos de grandes aquisições em 2025, como parte de uma corrida por inovação e domínio de tecnologias críticas.
Por fim, ele alertou que CEOs e líderes empresariais precisam assumir posturas mais corajosas. Segundo Galloway, o mercado está cheio de executivos que evitam decisões difíceis e apostam apenas no curto prazo — e isso pode custar caro no futuro.
As inovações premiadas no SXSW
Além das palestras e debates, o SXSW também é um espaço para celebrar a inovação na prática. Todos os anos, o festival promove duas premiações que se tornaram referência para quem acompanha o ecossistema de startups e tecnologia: o SXSW Pitch e o SXSW Innovation Awards.
O SXSW Pitch reúne startups em fase inicial para apresentarem suas soluções diante de uma banca de especialistas, investidores e formadores de opinião. Já o Innovation Awards reconhece produtos e projetos inovadores já em circulação, com impacto real em suas respectivas áreas.
Na edição de 2025, diversas iniciativas se destacaram — muitas delas com foco em inteligência artificial, acessibilidade, saúde digital e sustentabilidade. Entre os cases mais conectados ao universo de tecnologia e telecom, vale destacar:
- Polygraf AI (Austin, EUA)
Premiada em duas categorias, incluindo “Best in Show”, a startup desenvolveu uma plataforma de IA para análise avançada de dados, com foco em produtividade, tomada de decisão e automação inteligente em ambientes corporativos. - Wandercraft (Nova York, EUA)
Criadora de um exoesqueleto inteligente que ajuda pessoas com mobilidade reduzida a caminhar novamente. Vencedora na categoria “Artificial Intelligence”, une robótica e IA com aplicações concretas em saúde e reabilitação. - Daylight Computer (São Francisco, EUA)
Um tablet com tela que simula luz natural, criado para reduzir a fadiga visual e promover um uso mais saudável da tecnologia. Foi premiado na categoria “Design de Produto”. - SWEAR Security (Boise, EUA)
Destaque na categoria “WTF – What the Future?”, a empresa desenvolve soluções para autenticar conteúdos digitais e combater deepfakes — um avanço importante em tempos de desinformação. - “I SEE MUSIC!” by Synegram (França)
Vencedora em “Experiência de Áudio”, a startup propõe uma nova linguagem visual para a música, traduzindo sons em formas e movimentos — inovação que combina arte, acessibilidade e tecnologia sensorial.
Outro destaque foi o reconhecimento brasileiro na premiação: o Grupo Boticário venceu na categoria “Escolha do Público” com um protótipo de batom inteligente, desenvolvido em parceria com o CESAR, que auxilia pessoas com deficiência motora e visual a se maquiar com autonomia. O case reforça a presença da inovação nacional no cenário global de tecnologia de consumo.
Essas premiações funcionam como um radar das inovações que estão surgindo — e das que têm maior potencial de escalar. Para quem atua com tecnologia e telecom, são bons sinais de como a IA, a interface com o consumidor e a conectividade inteligente estão ganhando novas formas e aplicações concretas.
Já podemos nos preparar para o SXSW 2026? Claro que sim!
A cada ano, o SXSW se consolida como um espaço de antecipação — onde ideias ganham forma e inovações apontam o que está por vir. Acompanhar o festival é uma forma de se manter próximo das grandes transformações que movimentam o mercado.
E a próxima edição já tem data: o SXSW 2026 acontece de 6 a 14 de março, como sempre, em Austin, no Texas. Mas com uma novidade: o tradicional Austin Convention Center (onde acontecem as principais palestras) entrará em reforma, o que deve provocar mudanças estruturais no evento.
Se por um lado isso exige reinvenção, por outro, abre espaço para surpresas — e o SXSW sabe muito bem como surpreender.
Enquanto março de 2026 não chega, seguimos acompanhando de perto as transformações do mercado — e o que elas significam para os negócios.